Cantadas Literárias

Blog destinado à discussão da literatura em língua portuguesa.

Tuesday, January 16, 2007

LEITURAS AO VENTO E A MELHOR POESIA DE 2006

* Nelson Ascher, um dos nossos grandes poetas contemporâneos (nem tão valorizado quanto deveria), publicou artigo dos mais interessantes na Folha de S. Paulo de segunda-feira (15/01). Ascher discorre sobre intelectuais e literatura, sobre liberdade de ler e também sobre as amarras com que uma casta de pseudo-intelectuais tolhe os movimentos de quem procura apenas criar. É ponto de vista dos mais corretos, mas que pode ser expandido para o que se convencionou chamar de "política literária", estabelecendo parâmetros aleatórios daquilo que é bom ou ruim, baseados apenas no "grupismo". Quem está dentro, vale à pena; quem não, que morra à mingua. É assim que funciona a literatura no Brasil, infelizmente.

* Quase a complemento, Bernardo Carvalho (romancista soberbo), na Folha de hoje, mostra a perversão dos sistemas literários, tanto daqueles incrustrados em nações periféricas, quanto daqueles acastelados na metrópole. A propósito do cubano Virgilio Piñera (se acharem em algum sebo, leiam "Contos frios", edição Iluminuras), Bernardo expõe a fratura óbvia de nosso sistema político literário, em que o novo e diferente e bom, no mais das vezes, é escanteado ao milésimo plano.

* Tudo isso para falar de uma pequena enquete realizada pela revista virtual "Cronópios" ( www.cronopios.com.br ) em que alguns colaboradores ou não da revista dão sua lista daquilo que melhor se publicou em 2006. Na verdade, é o tipo da listagem que não dá para levar muito a sério, na medida em que um dos entrevistados por e-mail confessa que, até o ano da graça de 2006, não tinha passado sequer os olhos por coisas como "Macunaíma", São Bernardo" ou "Fogo Morto" (sem contar o fato de considerar "Viva o Povo Brasileiro" um clássico - como essa palavra está banalizada, meu Deus!). E o rapazola (assim acredito eu) se diz editor de um suplemento literário chamado "Augusto".
Enfim, antes que eu perca o fio e a meada, voltando ao que eu queria dizer, um dos que responderam à enquete foi Carlito Azevedo, poeta bastante bom, diga-se (e poderoso, via 7 Letras, se é que me entendem), cita apenas dois bons livros de poesia no ano ora findo: Raro Mar, de Armando Freitas Filho, e O roubo do silêncio, de Marcos Siscar. Nada contra a votação de Carlito, embora eu ache que Raro Mar, pelo peso de seu autor, fique devendo um pouquinho. A mim deixou um travo de que poderia ser mais. Já o Siscar, desde Metade da Arte, é poeta que merece atenção - tem estofo -, mas creio que ainda procura alçar vôos mais altos.
Daí que senti falta de três outras obras nessa mínima lista do Azevedo, e aproveito para dar meu pitaco. Árvore seca, de Alexei Bueno, me deu mais do que eu esperava. O mesmo posso dizer de O cão de olhos amarelos, de Alberto da Cunha Melo. Mas o que de melhor li, uma obra-prima realmente, foi Elegias, de Ivan Miziara. Profundo, denso, culto e com uma dicção própria e inovadora, para mim foi o melhor lançamento poético de 2006 (lembrando ainda que o mesmo autor lançou o belo Pela água nesse ano). Engraçado como Miziara é pouco conhecido em nosso meio literário. Talvez por ser médico, talvez por não fazer a tal "política" de que falamos acima. A respeito, vale conferir um estudo realizado por Izacyl Guimarães a respeito da obra desse autor ( http://www.ube.org.br/materias.php?cd_secao=76&codant=).
De todo modo e jeito, acredito que esses cinco livros foram o que de melhor tivemos em poesia nesse 2006. Se os prêmios literários nesse país fossem confiáveis (cabeça de crítico e de juiz...), a escolha deveria ficar entre esses. E só.

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